música - PORCAS BORBOLETAS - A PASSEIO

PORCAS BORBOLETAS - "A PASSEIO"
por Rômulo Giácome
Quem me conhece pessoalmente sabe que falo muito em PORCAS BORBOLETAS; Não por menos;; eles merecem muito; os conheci em Porto Velho, no festival Casarão. Fui abduzido. Geniais, eles revigoram a atmosfera Rock do nosso parco repertório nacional contemplado pela mídia. É tudo uma grande mistura entre Titãs de Cabeça Dinossauro (fases áureas) com Arnaldo Antunes da fase poética (solo), com performances inusitadas, mas muita força, feeling e vontade, elementos que fazem falta no poser/faker que o mainstream tem proporcionado.
O meu primeiro contato com o Porcas veio ao ver / entrever a performance de "Nome Próprio"; a forte enunciação letra / refrão, o entusiástico elemento verbo e guitarra me fizeram mordiscar a isca e contemplar mais um pouco; absurdamente criativos e legais, no bom sentido; um experimento bom, tal qual mistura de bebida no encandescimento das já tomadas; "Nome Próprio" é a segunda música do muito bom álbum "A passeio"; sua história está ligada à fatos, referências e filmes (e mais alguns ingredientes) que fazem uma banda estar na hora certa no lugar certo e pronto; esta forma plástica de grito do refrão, este eufórico processo de cantar "quando ela tira a roupa / algo se revela / ela tem uma tatuagem / de cicatriz" além de construir a linha veloz / violenta do refrão, demarca a ritmia e sonoridade das consoantes e vogais sibilantes, sonoras, ríspidas, tal qual a materialidade da tatuagem, sua rusticidade envolvida no acidente (cicatriz); o ritmo demarcado pela brasilidade do bumbo referenda algo na linha da Nação Zumbi com acidez e espírito loser. Música incansável e intensa, que não respira, só termina, no ar, pois fica na mente;

"A passeio" é um álbum distribuído por um selo independente e disponibilizado na Internet. Como música de abertura, "menos" traduz a letra inquietante e pós-moderna de Clara Averbuck. A sacada poética de "Pra viver mais / eu sei que é preciso viver menos", construída sobre a relação anti-análoga entre viver mais e viver melhor traduz a voravidade poética da palavra, seu trato, mas além disso, uma ideologia, um mote, uma virtude pop de construir um modo de vida, uma percepção sobre esta. A narrativa deslancha e cresce a medida que o baixo constrói um refrão / riff maravilhoso, esperado e ansiando a próxima "rodada"; é bem rock and roll, chegando a ser rock star, performático com ares guitar hero (quantos adjetivos rockers!!). Maravilhosa! é o meu sigle preferido. O disco também consegue incorporar estruturas melódicas na linha "Antuniana"; é o exemplo de "A passeio"; com levada psicodélica de teclado, ela incorpora um vocal claro e objetivo; o refrão faz um trocadilho com "nada no lugar / let it be / deixa estar"; uma bela canção, mesmo que não empolgue; Em "Dinheiro" a veia irônica e sarcástica do Porcas é mais acentuada; a capacidade narrativa de tecer crônicas humorísticas da realidade circundante tem vazão nesta canção; sua estrutura ritmica e melódica lembra, novamente, Arnaldo Antunes, mas incorpora alguns ingredientes pop que funcionam muito bem, como a valorização sonora do termo "dinheiro"; "gastei dinheiro / com você".
No entanto, o ápice do disco realmente está em "estrela decadente"; a marca máxima desta banda de Uberlândia está na enunciação desafiadora, lancinante, aguda e afiada com que desfere os golpes: "você sabe qual é o seu signo? / você não é escravo dos astros"; a força crítica do conteúdo encontra corpo na forma insendiária do refrão: "você não vai pro céu / nem vai ser estrela"; a música possui uma unidade, uma manifestação quase teatral, estruturada, o que a torna uma peça original; desde as micro inserções do programa do Sílvio, até a sacada que Sílvio Santos morreu em 1984 "o sílvio santos que você vê é de plástico"; perfeita; se porcas borboletas tivesse um logo musical, este seria "Estrela Decadente". Por fim, merece estreita análise e obervação o riff genial e marcado de "O Rato"; é impossível não materializar a encenação vocal, a forma cantada do "Rato", sua perfídia e insinuação; as formas do rato na voz e ritmo, cruzada pela guitarra e bateria enlouquecida; uma hora ou outra um piano microfônico invade, em pequenos pontos ensandecidos; o Rato, em sussurros, caminhando pela Sala, deixando rastros na canção; excelente faixa;
Porcas Borboletas é uma banda honesta em um cenário honesto de circuito alternativo; busca a criatividade e encontra muitas vezes bons momentos, como em "Dinheiro" e "Menos"; mas também constrói canções originalíssimas e antológicas, acima da média, como "O Rato" e "estrela decadente"; porcas borboletas não muda o mundo da música, mas pega o bastão e conduz com maestria o rock original brasileiro.

Comentários

Rômulo, eu me divirto com o quanto você curte esse cenário musical que não se faz midiático, mas que não impede essa riqueza que se encontra na tua percepção... acho que RollingStones e afins estão perdendo um grande crítico musical para enriquecer suas matérias, mas sei lá, vai que a Capricho te contrata para analisar Fresno e NX Zero... rs

Abraço
Rômulo, eu me divirto com o quanto você curte esse cenário musical que não se faz midiático, mas que não impede essa riqueza que se encontra na tua percepção... acho que RollingStones e afins estão perdendo um grande crítico musical para enriquecer suas matérias, mas sei lá, vai que a Capricho te contrata para analisar Fresno e NX Zero... rs

Abraço