VIAGEM PERU (JULHO/2013) - ROTA DO BARROCO ANDINO - TADEO ESCALANTE (HUARO)


UMA IMPORTANTE ROTA TURÍSTICA POR IGREJAS BELÍSSIMAS, COM OBRAS BARROCAS E COLONIAIS DE VALOR INESTIMÁVEL EM CUSCO E REGIÃO (BARROCO ANDINO) by Rômulo Giacome


Uma página interessantíssima da Arte Colonial Espanhola em solos "sulamericanos" é a pintura Peruana;  a transição da Cultura Inca para a Cultura Espanhola é um caso de proporções terrivelmente avassaladoras para esta cultura; a suplantação da cultura Inca pela cultura cristã Espanhola é feita sob várias bases de discrepâncias inacreditáveis: a primeira é a diferença tecnológica, que pode ser entendida pelo contrasta gritante da arquitetura Inca para a Arquitetura Espanhola; as igrejas que foram construídas sobre as construções Incas destoam em qualidade de edificação e tecnologia geométrica / estética; segundo, as bases morais e éticas da expropriação da cultura Inca pela Espanhola, em que esta última tinha apenas ideais exploratórios, ambiciosos e mercantilistas. A terceira base é o uso da religiosidade como forma de dominação, ferindo os próprios ideais cristãos supostamente deflagrados pela ideologia católica; aqui é interessante assinalar que, como uma religião que tem por bases a abnegação e solidariedade (compaixão), foi tão vil e maliciosamente utilizada com fins ignóbeis frente a culturas mais desenvolvidas, pregando a ignorância como forma de dominação.

Bem, é aqui que a Pintura tem seu enquadramento. Assim como em Ouro Preto, com nosso grande Aleijadinho (Antônio Francisco Lisboa), que fez uso magistral da arte Barroca como forma de resistência, de negação a valores coloniais e a ampla divulgação de supostos símbolos maçônicos / contestatórios ante à colônia / clero, no Peru a pintura Cusquenia também está sob a dialética do conflito cultural. Se bem que nem é possível falar em Dialética, uma vez que foi a dominação total de uma força supostamente majoritária, que imaginou que os peruanos, ao pintarem motivos cristãos, estariam pedagogicamente catequizando os iguais (GAMBOA, 2006, p.16). Por isso que os Jesuítas, considerado o braço armado da contra-reforma e autorizado a gastar e matar pelo papado, acreditou ser uma ideia genial, pois como não foi aqui no Brasil, onde nossa catequização era baseada em teias primitivas, lá o povo Inca já possuía forte cultura religiosa, complexa astronomia e arte. Logo, a arte colonial Andina, pintada sob as telas ideológicas da Espanha, procurava ser motivo de evangelização. Mas aconteceu o que era previsível, tendo em vista que alguns pintores, como os que citarei aqui, assim como nosso Aleijadinho, aproveitou-se da posição de artista do poder para, artificiosamente, implantar pequenas formas de resistência e contravenção ao sistema que agredia fortemente os valores culturais Incas. 

Assim, é possível enveredar pela pintura andina do Sul do Peru, reconhecendo estas marcas de irreverência (GAMBOA, 2006) ou crítica velada nos maravilhosos murais de Tadeo Escalante, na cidade de Huaro. A obra de Tadeo Escalante está exposta em alguns outros locais do Peru, mas principalmente na Igreja de São João Batista de Huaro, cidadezinha à 40 km do Peru. Seus murais estão dispostos em momentos fundamentais: A Glória, A árvore da Vida, As duas Mortes, O fim dos Tempos e o Inferno, esta última considerada a obra prima. Um olhar não tão especializado já consegue analisar e perceber marcas de irreverência, para não falar crítica ácida à sociedade religiosa, com imagens de clérigos e figuras históricas espanholas que se colocam em posições menores. 

Este roteiro turístico é pouco conhecido no Brasil, mas engloba grandes obras Barrocas (Igrejas como a Catedral de Cusco e Igreja das Missões Jesuíticas). O mapa abaixo descreve a rota do Barroco Andino pela rota Sul, passando por AndaHuaylillas, considerada a Capela Sistina da América do Sul, até a já citada Huaro e Urcos. 


 Abaixo, a Igreja de São João Batista de Huaro, com os famosos murais de Tadeo Escalante. Esta Igreja está localizada à 40km de Cusco e pode ser visitada por quem vai da Rota Puerto Maldonado / Cusco.

Riqueza da Igreja de AndaHuilillas; (as duas fotos abaixo) considerada a Capela Sistina da América do Sul, tem adornos riquíssimos em seu Adro e Altar.


Já na entrada, observe o teto coberto de folhas de ouro e caminhe bem devagar para não perder os detalhes. O mural exibe os caminhos entre o céu e a terra, é do século XVII e de autoria de Luis de Riaño. A Escola de Cuzco também se faz presente com várias pinturas sobre a vida de São Pedro e uma da Imaculada Conceição, atribuída a Esteban Murillo. O Altar em estilo barroco é feito de cedro coberto de folhas de ouro. 
Fonte: http://www.borapralacomigo.com.br/2014/09/vale-sagrado-do-rio-urubamba-peru.html

Tadeo Escalante: (abaixo) Observem a figura Clerical perturbada e fazendo parte do grupo, nus e empurrados para o Inferno; o chapéu faz uma alusão diferencial, conotando o poder em cheque. Figuras não católicas e presentes, como dragões. Fato que constituem uma simbologia que foge à iconoclastia Católica. 
Um Inferno Dantesco, múltiplo em agonia e simbologia do clássico purgatório; no centro, a representação do Demônio, iconoclastia italiana, mas de forte traço Cusquenio em função do traço da face; desespero, queda e instabilidade, corpos icônicos lembrando a obra de Bosh "Jardim das Delícias". 
A perfeita transgressão imagética entre os elementos do ocidente, caos e o mal puro, na figura da caveira que absorve a vida. (abaixo)

Abaixo, detalhe da caveira e a imagem angelical católica; a construção não nos permite entender outra configuração semiótica: a mentira é o que oculta; 


Queda, como a culpa e a expulsão do Homem do Éden: a falência do gênero humano


Sequência da Queda: seres híbridos de representação variada, povoando o imaginário clerical; 


É importante salientar que estas imagens estão dispostas em uma Igreja Católica e foram pintadas em meados de 1805; permaneceram por lá este tempo todo, com poucos estudos e descrições. 
Abaixo, visão contextual da "Última Ceia" de Marco Zapata, na Catedral de Cusco.


Abaixo uma visão mais clara de um quadro Colonial pintado por Marco Zapata, exposto na catedral de Cusco; o dendê no bacalhau; o pintor Cusquenio deixa sua marca Barroca na paixão de Cristo: Judas como o imperioso explorador espanhol Francisco Pizarro e o Cuy (um tipo de coelho da índia) como pão, prato típico de Cusco. 


REFERÊNCIAS

GALINDO, Alberto Flores.  In search of an Inca: Identity and Utopia in the Andes. Peru.  
GAMBOA, Jeremías. Visions of Heaven and Hell. 2006-2007. p.16-23.
CUSCO / CATEDRAL. Disponível em: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=381662
HUARO. Disponível em: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=1185497&page=1

ATUALIZAÇÃO EM 04/05/2017 (FOTOS DA VIAGEM REALIZADA EM JULHO DE 2013)


















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