"O CRÍTICO AUTOR E O AUTOR CRÍTICO" com EVANDO NASCIMENTO E MARCOS SISCAR
O CRÍTICO AUTOR E O AUTOR CRÍTICO
by Rômulo Giácome
by Rômulo Giácome
Qual a relação do crítico com sua própria obra? Quais os limites e intervenções da criação a partir do crítico-autor? Qual a convivência destas duas ações e personalidades? O presente texto discute estas questões a partir das respostas dadas pelos escritores / críticos Evando Nascimento e Marcos Siscar, na ocasião da mesa-redonda em que participei, ocorrida no 4º SILIC, em Vilhena, no dia 22 de Agosto de 2013. (Continue)
Com mãos sujas no tecido branco da
criação o crítico autor escreve com medo. Medo da sua própria linguagem e do seu
próprio projeto de literatura não se enquadrar no “projeto” de literatura
desenquadrado de todos. A composição ou esta divisão entre o ato criador e o
ato crítico parece que pode sim, caber em um mesmo corpo. O que muda é talvez a
postura, ou a práxis que cada ação desencadeia. Assim ocorre com os renomados e
sagazes professores / críticos / autores Marcos Siscar e Evando Nascimento. A
pergunta central é: “onde liga o crítico e desliga o criador”; ou “onde liga o
criador e desliga o crítico”, ou ainda “o crítico ligado junto ao criador” modula
entre várias nuances de respostas possíveis.
Talvez para
Evando Nascimento o ponto central é saber quando o “Crítico atua na própria
composição”, intervindo na mente criadora ou no próprio produto final. Assim,
constitui-se do querer saber os limites e (des)limites desta intervenção ao
nível da composição, efetuada por ação de uma mente crítica, que na modernidade tem sido
cada vez mais niilista. Parênteses meu (vivendo da evasão, o
discurso crítico sobre a crise torna-se um circunlóquio ad infinitum, que não deixa outra razão senão escrever e produzir. A
tensão provocada por esta angústia de entender a produção atual, seu pensamento
e pensar, faz da criação a melhor forma de fazer crítica. A crítica na própria
produção da obra. O que poderíamos entender como a práxis perfeita, na estreita
relação entre o refletir e o fazer. No entanto, a criação nem sempre desemboca
nas confluências da crítica literária e do pensar a arte. Muitas vezes ela é
produto de sínteses de vozes, modulações ou emulações próprias e inerentes à própria
arte, como é o caso do memorialismo ou auto-ficção).
Por
outro lado, a posição de Marcos Siscar acabou por se moldar na
premissa de que não são exatamente conflituosas as posições de crítico e
produtor. Na verdade são complementares e intercambiáveis. Isto porque elas não
atuam de modo independente. Elas se consolidam em momentos que podem se
interseccionar, seja quando acontece o refinamento da produção final, seja no
próprio pensar o projeto literário. O entendimento da criação enquanto diálogo
crítico é uma situação de escritura original e formadora, constituindo as
pontes com a literatura do passado e presente, definindo as vanguardas do
futuro.
Entre
o crítico autor e o autor crítico, também surge a ideia do leitor ideal, tão
amplamente revolvida por pensadores como Umberto Eco e Roland Barthes. Esta
figura virtualizada na mente do criador de arte é uma identidade nos murais do
marketing literário. Entender este perfil de leitor, livre, não açoitado pela
ideologia acadêmica, livre da docência e suas marcas ideológicas, abstêmio das
teorias e sistemas teóricos da esquerda e direita, dos fluxos de poder, das
formações discursivas que criam empatia, dos recursos midiáticos de compra e
proliferação da cultura livreira neste país, talvez seja a grande utopia do
criador em busca do seu leitor.
Talvez
o leitor ideal é aquele que consome a literatura sem propósito, livre de
pragmatismo e bandeiras. Frui o texto com a atenção do gozo e se alimenta dos diálogos
com o prazer. Bancários e Contadores,
leitores de Rubem Fonseca e Dalton Trevisan. Juristas que se deliciam com Camus
e Kafka. Mesmo que não queiramos, o fio fino de náilon liga um perfil a uma
coisa, e esta coisa é o livro.
O
leitor ideal não fundamenta estruturalmente a obra que lê, mas conta sua
experiência com o maior dos entusiasmos ao todos; esta obra vagueia pelas mesas
de bar e pode entrar em casas antes não acessadas; podem parar na mão de
adolescentes e, de repente, não mais que de repente, chegar em um programa de
entrevistas aparentemente culto de um canal fechado.
O
leitor ideal dialoga com o hoje: o econômico e o cultural, como assim queiram
os partidários de Jameson. O autor de hoje nem sempre é o crítico literário. O
autor de hoje nem sempre compartilha academicamente da literatura. Mas não o
pode ser se nunca fora um crítico. Crítico na melhor acepção possível. Talvez
na acepção romântica que Benjamin trata em seu estudo “O conceito de crítica de
arte no romantismo alemão”. Crítico no átimo da acepção “pensar a criação
literária”.
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